sexta-feira, 11 de novembro de 2016

Metades

Quarta-feira é dia de metades. Atenção cortada ao meio. Já esperamos o término da semana, na mesma medida em que o cansaço dos dias passados é amontoado num canto qualquer. Eu errei o caminho. Em um labirinto de rotatórias, dei de cara com uma rua sem saída. A Unesp esconde lugares só encontrados por aqueles que não querem ser vistos. Enquanto fazia a meia lua, pronta para retomar meu caminho, notei que eu era, naquele espaço, intrusa. Um casal fizera daquela rua mal cuidada o seu recanto. Entrelaçados de corpo e alma, sorriam em silêncio. Ignoraram o barulho do motor. Criaram uma redoma de paz ao redor. Tentei diminuir a aceleração - para não estourar o vidro que os isolava do mundo, mas também, de forma egoísta, para poder assistir por mais tempo aquela demonstração genuína de amor mútuo. Durante todo o momento em que os mantive em meu campo de visão, não trocaram nenhuma palavra. Não havia tempo para diálogos soltos. Ele sorria com os olhos e beijava-lhe a ponta do nariz. Ela abraçava-o como se a saudade fosse iminente ao descolar dos corpos. De repente, aquela grade enferrujada que servia de pano de fundo ganhou flores. Foi a declaração de amor mais linda que já vi. Desfeita de palavras e criada a partir dos silêncios que comportam os gritos paridos da essência que nos faz humanos.
Dei o braço a torcer. Há laços que não se apertam com palavras. Para existir, só precisam de um universo encaixado no intervalo entre dois olhares que, como imãs e sem porquês, não deixam afrouxar nossa fita colorida de cetim.