quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

Eu odeio meus pés

Eu odeio meus pés. A verdade é que, estando ali, no extremo, eles não chamam muita atenção. Eu, no entanto, os odeio mesmo assim. Quando adolescente, não me importava. Usava chinelos, sandálias e deixava-os à mostra. Em uma época, virou piada. O pé da Tamiris. Os amigos apontavam, riam e diziam que o pé da Tamiris destoava de todo o resto. Meus pés sempre foram minha maior imperfeição externa. E eu comecei a escondê-los. De repente, não tinha mais sapatos abertos, deixei os chinelos de lado. Sufoquei-os de calor. 
Certo dia, sai, sem perceber, mostrando-os. Quando me olhei no espelho do shopping, suei frio. Inquieta, sentia como se todos estivessem mirando para aquele meu dedo depois do dedão, maior e completamente desproporcional. Fui embora sem comprar o presente. Entrei no carro e chorei. 
Já pensei em cirurgias e tantas maneiras de amenizar o incômodo. Não há o que fazer. Os pés da Tamiris sempre farão parte de mim.

Penso em como teria sido se aquele dedinho não fosse motivo de riso. Provavelmente, eu continuaria usando chinelos, sandálias e sapatos abertos. Eu não os odiaria.
Enquanto embalava as compras de final de ano no mercado, duas crianças riam de uma terceira, que estava na fila ao lado. Apontavam-lhes as orelhas. Gargalhavam e faziam sinal de voo com as mãos. A menina, cabisbaixa, agarrou-se à perna da mãe. Aposto todas as minhas sapatilhas que ela estava pensando em uma maneira de esconder suas orelhas. Um modo de evitar que o mundo as visse.
Daqui alguns anos, essa mesma menina odiará uma parte de si. Lembrará do riso cada vez que se olhar no espelho. As gargalhadas ecoarão em seus ouvidos. E o ódio a fará perder confiança.
Eu odeio meus pés, mas, se continuar odiando-os, odiarei a mim mesma, pois eles fazem parte de mim. 
Disseram que eles eram minha imperfeição. Eu não quero ser perfeita. Na primeira semana do ano, comprarei uma daquelas sandálias abertas que morro de vontade de usar. Eles não são os pés mais lindos do mundo, eu sei. Não tem problema. Olhando daqui, eles até que têm seu charme. São, afinal de contas, inconfundíveis.

Eu sei que você já tentou esconder uma parte de si. Gargalharam do seu nariz, queixo, orelha, mãos e pés. Existem tantas possibilidades. Incontáveis. 
Pessoas passam uma vida querendo ser iguais ou semelhantes a outras. Condenam a si mesmas. Escondem-se.

O caso é que sua beleza não precisa de referencial. Quando ecoar aquelas gargalhadas que lhe fizeram odiar seu corpo, abafe-as com trechos de sua história que te fazem único(a). Elogie a si mesmo(a). E torne o riso sarcástico um som distante e quase imperceptível.
Eu vou fazer as pazes com meus pés. Na primeira semana do ano, vou fazer as pazes com meus pés.

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