quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

Se não recíproco, já deixou de ser

São cinco da manhã. Disseram que hoje é o primeiro dia do verão no hemisfério sul, mas, daqui, ainda uso aquela jaqueta feita para rebater o vento que chega aos meus cabelos molhados. Lavei na madrugada por acreditar que hoje, 21 de dezembro, era o primeiro dia do verão no hemisfério sul. Molhei os fios sem medo de gripe ou resfriado, esperando as altas temperaturas e sol da estação. Agora, estou aqui, em frente ao portão, tremendo, enraivecida com o não-chegar daquela quentura que sobe do asfalto.
Hoje, 21 de dezembro, é o primeiro dia do verão, mas há, ainda, tanto do outono, primavera e inverno nos dias. O clima, com inveja dos humanos, deixou de lado o existir cartesiano. Terça-feira chove, quarta faz sol e, na quinta, casaco nos braços. Prevê-se a máxima e a mínima, mas, a verdade é que não se pode lavar os cabelos na certeza do abraço aconchegante do mormaço da manhã.
Algumas pessoas simplesmente desapareceram da minha vida. Um mês planejando mandar mensagem, passou. Noutro, lembrei só dia sim, dia não. No terceiro, memória vaga. Já faz quatro e só consigo pensar no porquê faz frio no verão. Até tentei demonstrar chateação, afinal, alguns laços, penso, deveriam ser imanentes. O problema é que meu cabelo está tão molhado. Vou gripar. Deixa para lá.
Já são quase seis. Nessa espera de calafrios, apresentaram-me a imprevisibilidade, que, há muito e tantas vezes, já fez parte do meu rol de amigos. Ela soprou um segredo em meu ouvido. Não adianta lavar o cabelo ou amar as pessoas com uma certeza. O calor pode não vir, o sentimento, não eternizar.
Hoje, 21 de dezembro, é o primeiro dia do verão no hemisfério sul. Não fez calor pela manhã. Perdi um ou dois amigos no outono, outros três na primavera. O que antes me consumia, tornou-se alívio. Desisti de querer segurar em meus braços relações de amizade que só existem em definições antigas, de quando ainda era possível prever o comportamento do clima na mudança da estação.
Peso demais. O meu cabelo está tão molhado. Faz frio. As pessoas vêm e vão. São sete bilhões.
Podem até dizer que me tornei solitária, mas, a imprevisibilidade é senhora que dá as caras todas as manhãs, varrendo a calçada das certezas. Tremendo, percebo: não preciso, e nem devo, acertar sempre. Com o clima ou com as pessoas. Faz inverno no verão e algumas amizades, que pensei ser eternas, esgotaram-se.
Soltei alguns pacotes. Livrei-me de alguns pesos que só eu insistia em carregar. Destinei, assim, energia para meu próprio ser, aquecendo-me. Agora, está melhor. O cabelo parou de pingar. Os ombros já não sacodem mais.
Não, eu não sou insensível. Veja bem: é que amizade, assim como o amor, também acaba. Deixa sua marca, transforma, mas é também consumida pelo tempo. Foi bom enquanto durou.
Há de existir beleza no fim.
Larguei uma dezena de pacotes pelo caminho. Meu cabelo, finalmente, secou.
Se não é recíproco, já deixou de ser.

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